03/07/2008

FILMES E PSICANÁLISE...cont...

1984
Nineteen Eight Four, 1984, Michael Radford
Elenco: John Hurt, Suzanna Hamilton, Richard Burton

Antes de tudo, um desabafo : consegui novamente ler o livro que deu origem a esta adaptação e ver também depois o filme. Sim fui rever tudo porque gostei desde a primeira vez sem que ninguém precisasse me dizer que era bom. Mas a razão disto também, porque li um artigo recentemente na internet, na verdade uma resenha do filme e que me incomodou bastante. Ele comenta sobre a estória e blá-blá-blá e ao final conclui que este filme hoje em dia vale apenas a locação para se conhecer de onde vem o termo Big Brother. Olha que coisa mais lamentável, rasa e sem conhecimento. Então fui rever tudo de novo, como se fosse a minha primeira vez e continuo achando o livro sensacional, foi profético, que escrito na década de 40, mantém a metáfora do mundo atual. O filme retratou fielmente a obra, uma das melhores adaptações realizadas para o cinema. Parece que vejo na realidade os personagens retratados por ele.


Este filme, como já disse, é uma adaptação fiel ao livro de George Orwell (publicado em 1949), que retrata um mundo no futuro, onde o governo controla as massas, manipula seus pensamentos, muda o sentido da história e muda também o sentido das palavras usadas, conforme acham necessário, criando uma nova língua.



Sobre a estória do filme : O mundo está dividido em 3 super estados : a Oceania (América, Reino Unido e Austrália), Eurásia (Europa e ex-União Soviética) e Lestásia (China, Indochina, Japão e Mongólia). O mundo é dominado pelo regime totalitário e a liberdade limitada pelo Estado. A estória passa-se na Inglaterra, em Londres (considerada a capital da Oceania), e conta a vida de um homem chamado Winston Smith (John Hurt), funcionário do governo, no Ministério da Verdade, um órgão que cuida da informação pública do governo. Neste departamento, Winston cuida da retificação de notícias, ou seja ele é quem altera constantemente a verdade e a "História". Júlia (Suzanna Hamilton), sua colega de trabalho, lhe chama a atenção pela sua irreverência e sensualidade e se interessa por ela, o que é um problema grave pois num lugar onde onde sexo se não for para procriação é considerado crime. O´Brien (Richard Burton), uma pessoa enigmática, que lhe fascina pelo companheirismo que transmite. Ele compra um diário e começa a registrar suas memórias (mas ele não tem muita certeza dos fatos de sua infância ou de momentos antecedentes à mudança da política), que ele mesmo não tem muita clareza. Escondido dos telescreens (telas que vigiam as pessoas, inclusive dentro de suas próprias casas), Winston comete o maior dos crimes : o thoughcrime (crimidéia), ou em outras palavras pensar por si mesmo. Assim Winston se revolta contra esta sociedade repressora do Big Brother (Grande Irmão), juntamente com seus amigos mas não com coragem e força suficientes para seguir adiante, e percebe que não deveria ter feito isto.



Em Oceania não existe nem passado nem futuro, apenas um eterno presente, que por meio dele o Partido Interior controla toda a população do território. É a total abolição do passado para o controle total do futuro. Existe uma guerra permamente com o inimigo distante e a constante alienação da massa, chamada os Proles. Os 3 slogans do partido são : Guerra é paz, Liberdade é escravatura e Ignorância é força. O partido utiliza de 2 técnicas fundamentais para controlar a memória das pessoas : a Novilíngua, ou seja a nova língua que deve ser usada para controlar e limitar o pensamento, criando termos que na verdade diminuem a quantidade de palavras a ser usadas (o que ocorre em outras línguas é o inverso, é o acréscimo de termos e derivativos das palavras). A outra técnica é o doublethink (um dos termos criados pela Novilíngua que é o duplipensar). Significa a capacidade que o indivíduo deve ter de integrar em si, simultaneamente, duas convicções contraditórias, aceitando a ambas. Ou seja, na prática dizer mentiras deliberadas e acreditar nelas sinceramente.


O doublethink é utilizado para dominar as castas superiores e os Proles (que são um pouco mais de 80% da população) são de outra forma. Além de se alimentar do ódio pelo inimigo, são alimentados por pornografia barata, loterias cujos prêmios nunca saem, música fabricada por máquinas, literaturas de baixo nível. Mas Winston acreditava que um dia a Prole se rebelaria. Pois é nesta idéia, onde mora a esperança contra o retrato assustador da razão absoluta, que é o poder total deste mundo de 1984. Winston e Julia são presos pelos seus crimes, O´Brien se revela membro da thouchpolice (palavra criada também pela Novilíngua) e tenta cedê-lo ao partido.


Ao contrário do coleguinha que tão inteligentemente recomenda o filme pra conhecimento do termo Big Brother, eu quero enfatizar que se trata de uma obra fascinante pelo conteúdo, pela visão de Orwell, pela crítica à tirania da razão, que é identificada em 1984 como o poder total e absoluto, um fim em si mesmo não um meio. Para que a razão exista, é preciso reduzir tudo aquilo que é humano. Seu espanto está justamente nisto, no fenômeno do poder no máximo alcance, não só nos regimes totalitaristas mas porque não dizer também na democracia e nos seus dispositivos tão sutis.

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